BOLSONARO NÃO QUERIA SAIR DA SANTA CASA, por CONSUELO DIEGUEZ, REVISTA PIAUÍ

Se dependesse do candidato Jair Bolsonaro, ele teria ficado por mais tempo internado na Santa Casa de Misericórdia de Juiz de Fora. Ao fim da bem-sucedida cirurgia para reparar os estragos da facada que perfurou seu intestino, o presidenciável do PSL disse aos familiares que desejava permanecer ali. Mas, a 470 quilômetros, em São Paulo, integrantes do seu partido pensavam diferente. Antes mesmo do fim do procedimento para conter a hemorragia no abdômen, aliados, políticos e médicos se mobilizavam para removê-lo do hospital mineiro. Não confiavam nos colegas do interior que haviam salvado a vida de Bolsonaro. Em vez da instituição filantrópica que também atende pelo Sistema Único de Saúde, o SUS, queriam levá-lo para um hospital de grife. Era uma visão desinformada e que logo se provaria equivocada.

Bolsonaro chegou à emergência da Santa Casa às 15h40 da quinta-feira, 6 de setembro, alternando momentos de consciência e inconsciência, exangue, com a pressão em 7 por 4 e correndo risco de morte. Entrou empurrado por um séquito de correligionários, políticos, auxiliares, além dos quatro policiais federais que o escoltavam. As reações beiravam a histeria. Enquanto os médicos tentavam estabilizá-lo antes de submetê-lo a uma ultrassonografia, parte do grupo tentou invadir a sala para acompanhar o procedimento. Foram contidos por funcionários do hospital.

Com as lesões confirmadas pelo ultrassom, o candidato foi levado às pressas para o centro cirúrgico, no 14º andar, onde uma equipe de médicos formada pelo cirurgião do aparelho digestivo Luiz Henrique Borsato e os cirurgiões-gerais José Otávio Junqueira e Gláucio Souza se preparava para operá-lo. Os policiais federais insistiram em seguir o paciente no elevador até o centro cirúrgico. Enquanto acompanhavam a maca, gritavam, aos prantos, pelos corredores: “Mataram meu capitão”, “Mataram meu presidente”.

A direção da Santa Casa chamou a Polícia Militar para colocar ordem no hospital. Cerca de trinta PMs, comandados pelo coronel Oterson Nocelli, se postaram nas entradas da emergência e dos elevadores com o objetivo de barrar invasores. Ainda assim, o movimento às portas do centro cirúrgico era grande. Gustavo Bebianno, presidente interino do PSL e um dos mais próximos auxiliares de Bolsonaro, não desgrudou do deputado até que fosse para a mesa de cirurgia. Bebianno teve um pico de pressão, passou mal e também precisou ser atendido.

Na entrada do centro cirúrgico, apoiadores do candidato bateram boca com funcionários da Santa Casa que, seguindo regras internas, pediam que entregassem os celulares à segurança, para evitar vazamento de imagens do paciente. A equipe da Santa Casa atendeu ao pedido, mas a de Bolsonaro não. Ainda com a cirurgia em curso, fotos do candidato na mesa de operação chegaram às redes sociais. A cirurgia foi narrada em tempo real pelo WhatsApp.

A guarda do presidenciável continuava inquieta. Dois policiais federais exigiram permanecer no centro cirúrgico. Já os que ficaram do lado de fora, ao saber que o autor do atentado, Adélio Bispo de Oliveira, havia sido levado à sede da PF na cidade, berravam no centro médico, como se estivessem numa delegacia, que era preciso descobrir “os mandantes do atentado”.

Por volta das 16 horas, o cirurgião vascular Paulo Gonçalves Junior foi chamado para ajudar na cirurgia. Ele suturou a veia mesentérica e uma tributária, que haviam sido atingidas, o que provocara uma hemorragia abundante. Havia também risco de contaminação pelo vazamento do conteúdo do intestino para a cavidade abdominal. O quadro era grave e “muito tenso”, como descreveria depois um dos cirurgiões em mensagem de WhatsApp para amigos. Alheios à confusão no hospital e em todo o país, os médicos da Santa Casa operavam o paciente.

Dezenas de jornalistas se amontoavam na porta do hospital e compartilhavam informações desencontradas. As primeiras notícias eram de que o deputado fora submetido a uma laparoscopia, um procedimento cirúrgico pouco invasivo mas que não é recomendado para casos como o de Bolsonaro. Na verdade, ele passava por uma laparotomia, cirurgia de alta complexidade que exige a abertura de todo o abdômen.

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