Associação Médica Brasileira, urgente: Projeto de Lei em tramitação no Congresso ameaça liberar cigarros eletrônicos no Brasil

 

 

Encontra-se em tramitação no Senado Federal um Projeto de Lei de autoria da Senadora Soraya Thronicke que permite a produção, importação, exportação e o consumo dos cigarros eletrônicos no Brasil.

A Associação Médica Brasileira (AMB) lembra e alerta: tanto a comercialização, quanto a importação e a propaganda de quaisquer dispositivos eletrônicos para fumar, conhecidos como cigarro eletrônico estão proibidos no Brasil desde 2009, através da Resolução nº 46 da Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa).

Enfim, propõe-se que o Senado e o Congresso transforme em um lei um desserviço aos cidadãos, a todos nós. O Brasil tem reconhecimento internacional por sua política de controle do tabaco. Em julho de 2019, tornou-se o segundo país a implementar integralmente todas as medidas do MPOWER, ferramenta apresentada pela Organização Mundial de Saúde (OMS) em 2008, para ser utilizada pelos governos com o objetivo de reduzir o consumo do tabaco e proteger as pessoas das doenças crônicas não transmissíveis – DCNTs.

A pesquisa Vigilância de Fatores de Risco e Proteção para Doenças Crônicas por Inquérito Telefônico (VIGITEL) de 2021 demonstra a significativa redução da prevalência de adultos fumantes para 9,1%. Na primeira pesquisa, em 2006, a prevalência era de 15,7% (2). Já a Pesquisa Nacional de Saúde (PNS) de 2019 mostrou uma prevalência de usuários de 12,6% contra 34,8% em 1989.

A maioria absoluta dos DEFs contém nicotina – a droga psicoativa responsável pela dependência. Ao ser inalada, chega ao cérebro entre 7 a 19 segundos, liberando substâncias químicas que trazem sensação imediata de prazer.

Nos cigarros eletrônicos, ela se apresenta sob a forma líquida, com forte poder adictivo, ao lado de solventes (propilenoglicol ou glicerol), água, flavorizantes (cerca de 16 mil tipos), aromatizantes e substâncias destinadas a produzir um vapor mais suave para facilitar a tragada e a absorção pelo trato respiratório. Foram identificadas, centenas de substâncias nos aerossóis, sendo muitas delas tóxicas e cancerígenas.

O cigarro eletrônico em forma de pendrive e com USB entrega nicotina na forma de “sal de nicotina”, algo que se assemelha à estrutura natural da nicotina encontrada nas folhas de tabaco, facilitando sua inalação por períodos maiores, sem ocasionar desconforto ao usuário.

Em 2018, os fabricantes do cigarro eletrônico no formato de pendrive lançaram no mercado dispositivos para recarga dos cartuchos – os “pods” com concentrações entre 3% a 5% de nicotina. Cada pod do cigarro eletrônico no formato de pendrive contêm 0,7 ml de e-líquido com nicotina, possibilitando 200 tragadas, similar portanto, ao número de tragadas de um fumante de 20 cigarros convencionais. Ou seja, podemos afirmar que vaporizar um pendrive equivale a fumar 20 cigarros (1 maço).

Devido à nicotina, crianças, adolescentes e jovens que experimentam os DEFs têm um risco de iniciação no uso de cigarros convencionais 2 a 3 vezes maior do que aqueles que não os experimentam e mais de quatro vezes o risco de se tornarem fumantes de cigarros convencionais. Além disso, cresce a possibilidade do uso simultâneo de ambos os produtos (uso dual), o que aumenta muito o risco das doenças tabaco-relacionadas, já bastante conhecidas.

O uso de cigarro eletrônico foi associado como fator independente para asma, aumenta a rigidez arterial em voluntários saudáveis, sendo um risco para infarto agudo do miocárdio da mesma forma que o uso de cigarros tradicionais diários. Em estudos de laboratório, com camundongos, o cigarro eletrônico se mostrou carcinógeno para pulmão e bexiga.
Entre agosto de 2019 e fevereiro de 2020, ocorreu um surto de doença pulmonar aguda ou subaguda grave denominada EVALI (E-cigarette or Vaping product use-Associated Lung Injury), em usuários de cigarros eletrônicos (jovens em sua maioria), tendo sido notificados 2.807 casos nos EUA, com 68 mortes confirmadas. Esta doença pulmonar continua vitimando jovens usuários de cigarro eletrônico no Brasil e no mundo.
Todos esses estudos foram realizados em países onde o cigarro eletrônico é regulamentado, o que comprova que regulamentar o uso dos cigarros eletrônicos não irá reduzir o risco de exposição à substâncias tóxicas e cancerígenas.
O que está claro é que seu uso é prejudicial à saúde não trazendo nenhum benefício para seus usuários. Não precisamos de leis que liberem uso de substâncias prejudiciais à saúde. O argumento utilizado pela Senadora de que “a regulamentação desempenha um papel crucial na proteção da sociedade contra o consumo indiscriminado” não se sustenta.
A proteção da sociedade brasileira ante os riscos à saúde do uso do cigarro eletrônico, regulamentado ou não, se dá com a manutenção da proibição da sua comercialização e importação. Essa recomendação não é apenas da AMB, e sim da Organização Mundial da Saúde (OMS) e da União Internacional contra a Tuberculose e Enfermidades Respiratórias (The UNION).
O que o Brasil necessita é da manutenção das proibições estabelecidas pela RDC nº 46/2009 da Anvisa com a implementação de campanhas educativas, em especial para jovens e adolescentes; inserção de informações sobre os riscos dos cigarros eletrônicos na grade curricular das escolas, para a conscientização de crianças e adolescentes, e a melhoria na fiscalização em ambiente digital, fronteiras e pontos de venda, com uma maior interação com o Sistema Nacional de Vigilância Sanitária e Órgãos como a Receita Federal, Polícias Federal e Rodoviária Federal, Ministério Público, dentre outros.
Essa opção foi definida pela Anvisa por unanimidade na sua reunião colegiada de 07 de julho de 2022. Esta reunião gerou o Relatório Final de Análise de Impacto Regulatório sobre Dispositivos Eletrônicos Para Fumar. Porém ainda não finalizado pelo seu Diretor-Presidente.

Diante do exposto a Associação Médica Brasileira rejeita o Projeto de Lei 5008 de 2003 de autoria da Senadora Soraya Thronicke.